segunda-feira, 26 de março de 2018

Smashing Pumpkins: "num dia eu sou idiota, no outro sou gênio"


Lá em 2014, a revista Rolling Stone havia entrevistado o vocalista, guitarrista e (até então) o único membro original do SMASHING PUMPKINS, Billy Corgan. O músico falou a respeito dos shows atuais da sua banda - que incluem poucas músicas conhecidas do passado - e havia negado a possibilidade de uma reunião com os demais membros originais da chamada "formação clássica" - James Iha (guitarra), D'arcy Wretzky (baixo) e Jimmy Chamberlin (bateria).

Confira abaixo somente alguns trechos dessa entrevista:

Jornalista: Por que você lançou músicas individuais da sua banda pela internet entre os anos de 2009 à 2011, ao invés de preparar um álbum inteiro?

Billy Corgan: Isso remete de volta aos primeiros dias do rock and roll... Você é tão bom quanto a sua última música e eu estou mais ou menos de bem com isso. Neste momento, todo mundo gosta da minha nova música e a próxima eles vão odiar pra caralho, sabe? Um dia eu sou um idiota e no outro sou um gênio, sendo que já fui considerado ambos e provavelmente estou em algum lugar no meio disso aí. Basicamente, sou só um músico bastante bom.

O que nós estamos buscando agora é a presença perpétua e eu acredito que este será o novo caminho. De um ponto de vista artístico acho que é na verdade mais interessante, porque você está naquela cinética constante para frente e para trás como quando você era mais novo tocando num clube noturno, por exemplo. A coisa do rock corporativo que foi imposta, particularmente ao longo dos últimos 30 anos, é muito contra produtiva para a criatividade. Você entra num quarto escuro por 01 ano e espera-se que você produza alguma obra prima. Depois, você tem que sair em turnês até esgotar cada pessoa que potencialmente queira vê-lo, além dos seus próprios companheiros de banda e depois de sair dessa, espera-se que você se esprema e faça tudo outra vez. Na minha opinião, isto simplesmente não funciona mais. Voltamos a lançar um álbum de estúdio em 2012 ("Oceania", 7º disco), mas eu não sei se ainda continuarei a lançar álbuns desta maneira clássica, digamos assim...


Jornalista: Você ficou feliz com a recepção desse último álbum de estúdio dos SMASHING PUMPKINS, “Oceania”?

Corgan: Este álbum vendeu mais de 500 mil cópias e ganhou disco de ouro, mas as pessoas não o escutaram. Agora, é o melhor álbum que eu já fiz? Não. Mas eu percebia que as pessoas não estavam ouvindo o disco, sabe? No passado, se você lançasse um álbum, as pessoas ao menos conheciam a 1ª música do disco. Após lançar o nosso último álbum, "Oceania", nós saíamos e tocávamos a 1ª música e eu percebia que as pessoas nem tinham ouvido ela ainda. Eu vejo isso como um grande desapontamento... É decepcionante para mim que, o que eu estava tentando comunicar e informar às pessoas não tenha recebido a chance de ser comunicado. É impressionante para mim que as coisas vão e vêm e as pessoas nem mesmo sabem que elas aconteceram. Quando a banda HOODOO GURUS lançava um álbum, eu pelo menos sabia que eles tinham lançado um disco. Agora, eu vou até a loja e digo: "Oh! Esta minha banda favorita lançou um álbum? Porra, eu nem sabia!" Não sabia porque eu não olhei o website certo.


Jornalista: Várias grandes bandas do passado reuniram-se sem escrever qualquer material novo...

Corgan: Eu estive em contato com essas bandas como fã e em muitos casos como um amigo também. Eu digo a elas: "Por favor, escrevam novas músicas! Nós precisamos de vocês!" Quando eu trouxe o SMASHING PUMPKINS de volta (a banda havia encerrado as suas atividades em 2000, retornando em 2007), deixei bem claro e falei para os meus companheiros de banda: "Vai ser desse jeito ou de jeito nenhum". Se eu subisse no palco hoje à noite e houvesse somente 20 pessoas lá, eu mesmo assim não iria voltar atrás e não iria pedir para nenhum dos ex-membros da banda para retornarem a formação original. É isso. Acabou! Eu iria criar os meus filhos e ficar tocando ukulele. Eu nunca, jamais serei esse cara que iria voltar atrás. Eu disse muitas coisas no passado e voltei atrás, mas posso garantir a você que nunca serei esse cara. Simplesmente não está no meu DNA.

Quando nós nos separamos em 2000, havia um grupo de pessoas que pensavam que o SMASHING PUMPKINS era uma banda muito importante e do outro lado havia o resto do mundo. Eu poderia lançar 40 músicas e as pessoas continuariam dizendo "É, não é tão bom quanto as músicas do álbum 'Mellon Collie and The Infinite Sadness' (3º álbum de estúdio, 1995)". Metade dessas pessoas prefeririam nos ver tocando o disco “Siamese Dream” inteiro na turnê (2º álbum de estúdio, 1993).


Jornalista: Muitos dos fãs ainda estão concentrados na formação original da banda...

Corgan: Naquela formação você tinha 02 pessoas que podiam tocar em um alto nível de capacidade musical e outras 02 pessoas que não podiam - e de algum jeito aquilo funcionou. James, D'arcy e Jimmy..., pessoas fascinantes. Jimmy, baterista de nível mundial. James, muito criativo quando ele queria. D'arcy, tinha um senso intuitivo incrível, mas aquela banda não foi feita para durar. Acredite em mim, se aquela banda ainda tivesse qualquer coisa a oferecer, não apenas eu o faria porque seria interessante criativamente, mas seria incrivelmente lucrativo financeiramente. As pessoas dizem: "Vamos lá, apertem as mãos no backstage e viagem em ônibus separados". Parte do meu ser e da minha pessoa espiritual é: eu não estarei numa banda com pessoas que não gostam de mim.


Jornalista: Você acha que esta encarnação atual da sua banda foi feita para durar?

Corgan: Eu realmente espero que sim e sou negligente em dizer isso, porque eu não sei. Coisas muito esquisitas já aconteceram comigo, sabe? As pessoas simplesmente enlouquecem ou coisa do gênero... Em termos de unidade emocional, nesse momento eu me sinto tão bem quanto na antiga formação original da banda. Todos nós parecemos estar na mesma página e não há nada esquisito. Todo mundo na banda meio que se sente: "OK, estou no lugar certo". E eu disse a cada um deles: "Nós estamos no lugar certo e na hora certa".


Jornalista: É difícil ouvir as músicas da sua infância sem que a nostalgia ou o sentimentalismo atrapalhem a apreciação da mesma?

Corgan: Sim, é verdade... Uma coisa que eu aprendi com o passar dos anos é tocar no momento em que você se encontra - você não pode mais voltar naquele tempo, ok? Eu tenho que tocar essas velhas músicas, mas quando eu resolver toca-las será com uma visão atual, de 2014. Você não pode recriar novamente aquele cenário do ano de 1992... Simplesmente não vai acontecer.

Tem muita música que eu tentei tocar em ensaios e eu só digo para a banda: "Não, não soa certo". A banda soa muito contemporânea e esse é o melhor jeito de descrevê-la. Nós estamos na corda bamba tentando soar contemporâneos sem ficar sentimental e eu acho que nos tempos atuais, sentimentalidade com música é morte.

No fim do dia, não importa quais sejam as minhas origens, eu estou basicamente tocando uma forma bastarda de rock. E rock com sentimentalismo é uma má mistura nos dias de hoje, sabe? Então, do jeito que eu vejo as coisas, por exemplo, nós estamos fazendo uma versão da minha música chamada "Star", e o modo como eu abordo isso e como tento cantar a letra, é diferente daquele rapaz de 25 anos que cantou lá na década de 90 sobre ter sofrido um abuso infantil. Estou aqui como um homem na casa dos 40 anos que tem uma nova visão sobre o mundo, então, a letra soa diferente e eu não trato isso como um momento especial na minha vida, eu trato isso como uma coisa muito relevante que tem um significado diferente para um cara na casa dos 40 anos - em contraste com o cara de 25 anos que eu era quando a escrevi. Eu aprendi muito com BOB DYLAN sobre essa abordagem.


Jornalista: Parece que a audiência está acompanhando a mudança...

Corgan: Escuta amigo, quem é você para dizer o que a audiência acompanha, você me entende? Eu aprendi há muito tempo a fazer o que gosto de fazer e deixar que as fichas caiam onde devem cair. Estou frequentemente espantado pelo jeito de como as pessoas interpretam o que eu faço, para melhor ou para pior. Nesse ponto, elas vêem fantasmas onde não existem fantasmas e ouvem vozes onde não existem vozes. Estou em um lugar feliz, sabe? Estou muito entusiasmado por tocar a minha música do jeito que eu quero. Na minha carreira, esse é um bom momento que estou passando e sinto uma sensação de realização só de estar em um lugar saudável com uma banda saudável. Os fãs se empolgam com os nossos shows e eu só não entro mais no mainstream porque isso é uma montanha russa.

Eu tive que chegar ao ponto onde, como homem, tenho que estar bem com o meu sistema nervoso e não ser pego no pé de mais ninguém. Porque, acredite, eu ouvi isso por 25 anos, a porra do mundo indie (alternativo dos anos 90) dizendo como você deveria ser, como deveria se vestir, como deveria pensar, como deveria agir em seus shows, sem solos de guitarra e toda aquela merda dos anos 90. Você se cansa de ouvir isso.


Jornalista: O sentimento contemporâneo da banda que você mencionou parece uma boa justificativa para continuar sob o nome SMASHING PUMPKINS, tocando as suas músicas mesmo com as críticas...

Corgan: Vamos examinar essas coisas um pouco. Número 01: o nome da banda. Bom, todo lugar que eu vou, as pessoas dizem: "É aquele cara do SMASHING PUMPKINS". Então, eu sou o SMASHING PUMPKINS, quer eu queira ou não. Como um indivíduo, eu gosto de ser o SMASHING PUMPKINS. Então é a minha escolha, é algo que eu escolhi fazer e acredite em mim, ser o SMASHING PUMPKINS vem com muita bagagem, cara... Não é um patrimônio limpo.

Então, eu posso estar aqui e dizer com toda a integridade que eu sou o SMASHING PUMPKINS porque eu quero ser. E o fato de eu estar lançando novas músicas, estar sendo um artista progressivo nos meus shows, estar tocando novas músicas nos shows, estar lançando música de um jeito que muitas pessoas não teriam coragem de fazer, eu acho que isso é evidente. Para mim, essas questões falam mais sobre a opinião sentimental das pessoas do que o que elas querem que eu seja, preso aos álbuns dos anos 90 ou algo assim. Por que o SMASHING PUMPKINS não pode continuar?

Quando Michael Jordan (jogador de basquete americano) saiu da aposentadoria, as pessoas pensaram, "Ele está arruinando o legado!" Bem, ele queria jogar basquete, cara... Eu só não entendo isso. Por que eu não posso fazer o que eu quero? Você é criticado como um artista se você se rende às opiniões alheias e aqui eu estou, não me rendendo e ainda sendo criticado por isso. Eu não entendo a lógica que vocês seguem, jornalistas, mídia, a imprensa em geral, assim como alguns fãs da minha banda, e vocês não entendem a lógica sobre a qual eu vivo.

Estou feliz! Essa é uma coisa que as pessoas deveriam compreender. Não estou miserável ou implorando por um cheque. Estou feliz! Estou tão feliz quanto eu estava em 1996 com o SMASHING PUMPKINS e isso não é importante? Por que as pessoas não falam sobre isso? Para mim essa é a cultura de morte que quer tudo em uma caixa organizada, sendo que não vivemos mais em um mundo organizado. Por que a banda U2 não se aposenta? Eles não fizeram dinheiro suficiente? Por que o ROLLING STONES ainda saem em turnê? Só há o Mick Jagger, Keith Richards e o Charlie Watts da formação original... Por que eles não se aposentam? Eu não entendo vocês. Se as pessoas querem tocar e querem ir, que porra de diferença faz? Deixem eles serem felizes!

Para melhor ou pior, por 20 anos eu fui uma força cultural - pelo menos no meu canto do mundo - e ainda tenho um pouco desse poder. Um pouco foi adquirido, outro pouco me foi dado e o resto só me segue no mito, mas eu ainda estou aqui fazendo coisas boas. Quero dizer, estou andando por ai como um cara normal na casa dos 40 anos, sendo que eu não bebo e não uso drogas há 10 anos. Falo abertamente sobre Deus e eu estou aqui, feliz e sorrindo. As pessoas me verão feliz e qual é o problema? Não há problema nisso... Existe um problema sendo criado por uma necessidade intelectual de se explicar algo inexplicável.


Jornalista: A implicação é que você nunca será tão bom quanto antigamente...

Corgan: Ouça, não há maior insulto para mim como artista do que basicamente dizer implícito que você nunca será tão bom quanto você foi. Minha resposta para tudo isso é: Vai se foder! Volte e viva na terra dos vídeo clipes, pegue a revista Rolling Stone de 1994 e leia sobre a integridade indie (alternativa dos anos 90), veja Kurt Cobain em uma foto no pé de um morro vestindo uma camisa escrita: "Corporate Magazines Suck". Você pode viver isso para sempre, mas para mim já deu. Estou me mudando para a próxima cidade, você sabe? Eu tenho um cavalo diferente e estou cavalgando para um novo horizonte, sendo que as pessoas que estão em volta parecem estar se divertindo.


Jornalista: Vamos falar sobre as coisas novas... Você já ouviu falar sobre o movimento da "slow food"?

Corgan: Não.


Jornalista: É o contrário do fast food, ou seja, da fazenda para a mesa. Agricultura sustentável, uma abordagem meticulosa e pensada para a comida. O que você está fazendo online, lançando música por música, demorando 05 anos para lançar um álbum, soa quase que um movimento de "slow music" (música lenta).

Corgan: Eu gostei da sua observação... Há um ingrediente chave que irá fazer desse um trabalho de longo termo: a música tem que ser fantástica. Se você for escutar um álbum novo e a qualidade baixar na 3ª, na 5ª ou na 7ª música..., já era, as pessoas não irão mais curtir o álbum como um todo, ou então, poderão até descarta-lo por completo. Isto põe a pressão ao máximo sobre a minha cabeça para que eu sempre eleve o nível dessas músicas lançadas individualmente.

Adoro estar de volta no momento da pressão. Veja, quando eu era mais novo, pressão era: "Você pode me dar um hino do rock? Você pode me dar uma música que irá tocar na MTV?" Todas estas pressões se foram agora, então, onde eu vou achar tal nível de stress? Eu tive que criá-lo sozinho.

Coloquemos desse modo: eu não vou ganhar uma crítica boa de uma revista Rolling Stone da vida. Eu não vou receber esse tipo de..., apoio. Eu preciso descobrir um meio de sustentar o meu próprio nível de integridade baseado no meu próprio sistema de autenticidade e não no de outra pessoa. Porque todos estes sistemas corporativos estão quebrados, quer alguém perceba isso ou não. Porque a falta de alto nível na música que vem dos shows alternativos está se tornando muito precoce e a qualquer hora, que qualquer artista se torne muito precoce, ele se torna precioso sobre si mesmo e então basicamente agoniza e morre. Até que alguém venha atrás e descubra um jeito de fazer isso de um modo mais fácil e divertido, porque eles estão se tornando muito intelectuais daquele outro lado da cerca. Quando a música vai para lá, isso é o pior. Isso é realmente pior que o hair metal dos anos 80 quando você atinge isso.

Confira o áudio da canção "Quasar" e que abre o álbum "Oceania":



rockinthehead

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